sábado, 13 de agosto de 2011

Artigo publicado na revista História, Ciências, Saúde - Manguinhos


No último número da revista História, Ciências, Saúde - Manguinhos, dedicada a pesquisas nas áreas de história das ciências e história da saúde, saiu um artigo escrito por mim e pela professora Dominichi Miranda de Sá. O resumo, o link para as versões do artigo em português e inglês e uma das imagens presentes no artigo estão abaixo.

RESUMO

Analisa as relações entre doenças, conhecimento e ocupação do território na Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas de Mato Grosso ao Amazonas, mais conhecida como Comissão Rondon. A Comissão, entre 1907 e 1915, atravessou de sul a norte amplas regiões do que são hoje os estados de Mato Grosso, Rondônia e Amazonas, na faina de instalar linha telegráfica que seria responsável pela integração dessas regiões às principais cidades brasileiras. Ao longo do tempo, a malária, doença endêmica nas localidades percorridas, forçou a Comissão a abrir mão de alguns objetivos e a retardar a realização de outros. O impacto dessa doença nos trabalhos da Comissão, com destaque para a criação de um serviço sanitário primordialmente destinado a seu controle, é o foco deste artigo.

Palavras-chave: Comissão Rondon; telégrafo; território; malária; Brasil.

http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-59702011000200010&script=sci_arttext






quarta-feira, 6 de julho de 2011

Os brucutus donos da cultura




Na última sexta-feira, dia 01/07 fui, com outros professores, acompanhar um grupo de alunos do Colégio Maria Raythe a um passeio à Academia Brasileira de Letras (ABL). A expectativa era a de uma agradável visita a esta simpática instituição de nosso país que, de acordo com o artigo 1º de seu estatuto, ”tem por fim a cultura da língua e da literatura nacional”. Apesar de minhas ressalvas às visitas guiadas – muitas vezes enfadonhas e cheias de textos decorados e cuspidos diante dos alunos como palavras vazias jogadas ao vento – pairava sobre minha cabeça a ideia de que os alunos sairiam da visita com um interesse maior pela cultura literária. Ao final da visita, esta ideia mostrou-se ingênua e inteiramente equivocada.

Assim que chegamos, fomos bem recebidos pela equipe que nos guiaria pela visita. A responsável pelas visitas, Terezinha, mostrou-se, a princípio, bastante simpática comigo, e imaginei que tudo transcorreria sem maiores problemas. No entanto, bastou o início da palestra dos guias para começar a sentir algo de estranho no ar. Semblantes fechados, pedidos aos professores para que “controlassem” seus alunos e reprimendas deixaram, antes mesmo de nossa entrada no Petit Trianon, o ambiente tenso.

Assim que entramos no palácio teve início a apresentação teatral por meio da qual o espaço e a história da ABL nos seriam apresentados. Dois atores e uma atriz (belíssima, por sinal) cantaram músicas – ou poemas musicados – de autoria dos acadêmicos, informaram-nos sobre pequenos e divertidos incidentes entre eles e expuseram, através de um texto dinâmico e leve, os principais traços da Academia. Até aí, uma surpreendentemente boa visita guiada.

O problema é que tanto a responsável pela visita quanto os atores/guias e até mesmo os seguranças (em número inimaginável) não perderam nenhuma oportunidade de mostrarem-se grosseiros e indelicados com os alunos e, de modo geral, os visitantes. Sempre me incomodou a postura de alguns indivíduos e de algumas instituições culturais que se colocam num pedestal sagrado e passam a tratar o restante dos seres humanos como miseráveis incultos mendicantes de um pouco de “cultura”.

Aliás, eis uma palavrinha complicada... cultura. Sem querer entrar em discussões intermináveis sobre o conceito, não poderia deixar de tecer alguns comentários sobre o mesmo. Cultura não é uma coisa que algum indivíduo ou instituição de grande benevolência pode doar do alto de sua magnanimidade aos bárbaros que não a possuem. Todos os seres humanos que crescem fazendo parte de um grupo têm cultura. Um aborígene australiano do século XVII, uma socialite americana do século XXI e um monge erudito do século XV têm cultura. Aliás o homem já foi definido, pelo filósofo David Hume, como animal cultural.

Pois bem, esta não parece ser a noção de cultura partilhada pelos funcionários da ABL que nos guiaram. Para eles a cultura é algo mágico, esotérico, que alguns escolhidos (eles) possuem e outros (nós, seres obviamente inferiores) devem curvar-se para receber em doses homeopáticas numa espécie de ritual sagrado. E o que difere os “donos da cultura” dos “bárbaros mendicantes”? As palavras mágicas. “Machado de Assis”, “Rachel de Queiroz”, “Araripe Júnior”, “Graça Aranha” e até mesmo - pasmem! – “Roberto Marinho” e “José Sarney”. É o fato de pronunciarem estas palavras mágicas que diferenciam os iluminados funcionários da ABL – estes eruditos da decoreba – de nós, os sem cultura.

Mas o pior não é essa brilhante teoria – insustentável diante de qualquer indivíduo que possua suas faculdades intelectuais não comprometidas por qualquer doença degenerativa –, o pior é a sua conseqüência. Os donos da cultura arrogam para si o direito – eu diria o dever – de usarem todo e qualquer tipo de ameaça, constrangimento e desrespeito para que o ritual místico da doação de cultura não se contamine com qualquer tipo de emoção. Exclamações, risos, olhares de surpresa ou de curiosidade estão expressamente proibidos no ritual. Adolescentes curiosos devem se transformar em múmias paralíticas; jovens excitados devem tornar-se zumbis; professores interessados devem se converter em policiais. Todos devem abaixar suas cabeças como cordeiros para receberem a dádiva que lhes é ofertada. Talvez o escritor mais amado por nossos guias – se é que eles conhecem algum – não esteja na Academia Brasileira de Letras. Trata-se de um autor nascido na distante Bombaim: Rudyard Kipling, aquele do “fardo do homem branco”.

A nota positiva da visita ficou por conta do único Acadêmico com o qual pudemos travar contato. Atendendo a um pedido meu, que fui seu aluno há alguns anos atrás no curso de História da UFRJ, o professor José Murilo de Carvalho gentilmente se dispôs a, entre uma reunião e outra, conversar por alguns minutos conosco. Sua cortesia, respeito e atenção - e até mesmo sua fala mansa e baixa – contrastaram profundamente com a deselegância, desrespeito e arrogância dos funcionários da instituição. Ficou a impressão de que os acadêmicos estão muito mal representados por aqueles que lidam diretamente com o público desejoso de conhecer um pouco da ABL.

Ao final da visita, um misto de decepção, tristeza e indignação foi o que ficou. Indignação pelo desrespeito aos seres humanos que abriram mão de seu tempo livre numa tarde de sexta-feira para conhecer uma instituição e voltaram para casa cheios de vitupérios na bagagem. Tristeza por ver um trabalho até bem feito (quero lembrar que elogiei o texto e a encenação dos atores durante a visita) jogado por água abaixo em função da grosseria de pessoas sem o menor preparo para lidar com outras pessoas. Decepção porque tenho a convicção de que toda vez que os alunos passarem os olhos sobre o livro de algum Acadêmico, não sentirão simpatia e nem interesse em abri-lo. Antes disso, lembrarão dos insultos que sofreram durante a traumatizante visita. Ao invés de mais próximos, esses adolescentes estão, nesse exato momento, mais distantes da “cultura da língua e da literatura nacional” que a ABL deveria, de acordo com seu próprio estatuto, promover.

terça-feira, 31 de maio de 2011

A Revolução Russa no mundo contemporâneo.

Este post inaugura uma nova fase do blog, na qual serão publicados aqui resultados expressivos de trabalhos realizados sob a minha supervisão por diversos alunos com os quais aprendo história. E esta nova fase não poderia ser inaugurada de uma forma melhor. Apresento aqui o excelente trabalho sobre a Revolução Russa realizado pelos alunos Henrique Araújo e Matheus Andrade do nono ano do Colégio Maria Raythe. Aqui, além de apresentarem de forma concisa o que foi a Revolução Russa, Henrique e Matheus realizam uma reflexão bastante bem construída sobre a importância deste movimento para a história contemporânea.

Boa leitura!

A Revolução Russa no mundo contemporâneo



A Revolução Russa, 1917



A Revolução Russa



A Revolução Russa de 1917 ocorreu no momento em que o país estava envolvido na Primeira Guerra Mundial, mas as suas causas, para além da campanha desastrosa na guerra, foram a crise econômica, a instabilidade política e o descontentamento social que já estavam presentes na Rússia antes mesmo do conflito. Os principais capítulos deste aumento da tensão na sociedade russa do início do século foram o Domingo Sangrento, episódio no qual mais de 2 mil pessoas fizeram uma manifestação pacífica e foram massacradas pelas tropas do czar, a revolta do encouraçado Potemkim e o fortalecimento de vários grupos de oposição, como o Partido Social Democrata - que foi dividido em dois grupos: os bolcheviques e os mencheviques - e o Partido Anarquista.

Em 27 de março de 1917, uma revolução comandada pelos mencheviques tirou à força o czar Nicolau II do trono. Com a monarquia extinta, dois líderes socialistas bolcheviques voltaram à Rússia para tentar implantar o socialismo naquele país: Lenin e Trotsky. Enquanto os sovietes eram liderados por Lenin, Trotsky organizou um exército formado por trabalhadores e bolcheviques, chamado de Guarda Vermelha.

Em 6 de novembro iniciou-se a Revolução Bolchevique (também chamada simplesmente de Revolução Russa). Os operários tomaram vários pontos da cidade de São Petersburgo e cercaram a sede do governo, forçando Kerenski, líder dos mencheviques, à renúncia. Logo após a revolta, os sovietes escolheram os membros do Conselho dos Comissários do Povo. Em novembro de 1917, Lenin foi nomeado chefe de governo. Era, dessa forma, erguido o novo governo russo.



A Revolução Russa na contemporaneidade



Na política de hoje, o termo revolução se refere a movimentos e acontecimentos que acabam mudando a ordem social, econômica e política de um país, nação ou mesmo de todo o planeta. Foi o que ocorreu na Rússia, que eliminou as classes sociais, mudou seu tipo de economia, e alterou totalmente sua forma de governo, deixando de ser um império para tornar-se uma República Socialista. O novo governo russo teve sua economia e política baseadas nas ideias socialistas de Karl Marx e Friedrich Engels. Eles defendiam a ideia de que a luta de classes era o motor da história. Também acreditavam que a igualdade só aconteceria após o confronto entre exploradores e explorados, com vitória dos últimos e o domínio do Estado pelos operários, que transformariam o sistema capitalista em socialista e construiriam uma nova sociedade sem divisões de classes, o que foi colocado em prática na Rússia a partir de 1917.

A Revolução Russa foi a primeira no mundo a materializar as ideias socialistas, abolindo a propriedade privada. Além disso, houve o fortalecimento dos movimentos operários, a criação de partidos comunistas em todo mundo e o fortalecimento da bipolaridade ideológica: capitalismo (poder do mercado) x socialismo (poder do Estado).

Após a Rússia, vários países adotaram o socialismo, como a Mongólia e os países da Europa oriental: Iugoslávia, Hungria, Alemanha Oriental, Polônia, Bulgária, Tchecoslováquia e Albânia. Posteriormente, outros países também aderiram ao socialismo: China, Cuba, Vietnã, Camboja, Laos, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, entre outros. Embora a União Soviética tenha sido o modelo desse bloco de países, o socialismo não se aplicou da mesma forma em todos eles.

http://www.youtube.com/watch?v=3HWyK7bkGy4
Lenin discursando: O que é o poder soviético?

Fontes:

www.mundovestibular.com.br
www.cienciamao.usp.br
www.aticaeducacional.com.br
Livro História Moderna e Contemporânea – Volume Único – Ed. Ática, 2008.
Livro Panorama da História – 8º e 9º ano – Editora IBEP, 2006 e 2010.

Henrique Araújo e Matheus Andrade

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Links de publicações.

Para aqueles que quiserem conhecer um pouco mais o meu lado historiador, estou disponibilizando alguns links de artigos e outros escritos que já publiquei.

1- Os relatórios Médicos da Comissão Rondon. ANPUH-Rio - 2008.

http://www.encontro2008.rj.anpuh.org/resources/content/anais/1212965378_ARQUIVO_OsRelatoriosMedicosdaComissaoRondon.pdf

2- O Medo do Sertão. Dissertação de Mestrado - 2009.

http://www.fiocruz.br/ppghcs/media/dissertacaoarthurcaser.pdf

3- Texto no Portal Fiocruz que apresenta a Dissertação de Mestrado.

http://www.fiocruz.br/ccs/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=2832&sid=5

4- Médicos, doenças e ocupação do território na Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas de Mato Grosso ao Amazonas (1907-1915). Museu Paraense Emílio Goeldi - 2010.

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S1981-81222010000200010&lng=en&nrm=iso&tlng=en

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

É o mesmo Tiradentes???



Acórdão judicial que condenou Tiradentes e outros inconfidentes mineiros

Mostra-se que na Capitania de Minas alguns vassalos da dita Senhora, animados do espírito de pérfida ambição, formaram um infame plano para se subtraírem da sujeição e obediência devida à mesma Senhora, pretendendo desmembrar e separar do Estado aquela Capitania, para formarem uma república independente, por meio de uma formal rebelião, da qual se erigiram em chefes e cabeças, seduzindo a uns para ajudarem e concorrerem para aquela pérfida ação, e comunicando a outros os seus atrozes e abomináveis intentos, em que todos guardavam maliciosamente o mais inviolável silêncio, para que a conjuração pudesse produzir o efeito que todos mostravam desejar, pelo segredo e cautela com que se reservavam de que chegasse à notícia do governador e ministros; porque este era o meio de levarem avante aquele horrendo atentado, urdido pela infidelidade e perfídia; pelo que não só os chefes cabeças da conjuração e os ajudadores da rebelião se constituíram réus do crime de lesa-majestade da primeira cabeça, mas também os sabedores e consentidores dela pelo seu silêncio; sendo tal a maldade e prevaricação destes réus, que sem remorsos faltaram à mais recomendável obrigação de vassalos e de católicos, e sem horror contraíram a infâmia de traidores, sempre inerente e anexa a tão enorme e detestável delito.
Mostra-se que entre os chefes e cabeças da conjuração o primeiro que suscitou as idéias de república foi o réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha o Tiradentes, alferes que foi da Cavalaria paga da Capitania de Minas, o qual há muito tempo que tinha concebido o abominável intento de conduzir os povos daquela Capitania a uma rebelião pela qual se subtraíssem da justa obediência devida à dita Senhora formando para este fim publicamente discursos sediciosos (...).
(...)
Mostra-se que tendo o dito réu Tiradentes publicado aquelas horríveis e notórias falsidades, como alicerce da infame máquina que pretendia estabelecer, comunicou em setembro de mil setecentos e oitenta e oito as suas perversas idéias ao réu José Alvares Maciel, visitando-o nesta cidade a tempo que o dito Maciel chegava de viajar por alguns reinos estrangeiros, para se recolher a Vila Rica donde era natural, (...) ; e tendo o dito réu Tiradentes encontrado no mesmo Maciel não só aprovação, mas também novos argumentos, que o confirmaram nos seus execrandos projetos, (...) saíram os referidos dois réus desta cidade para Vila Rica, Capital da Capitania de Minas, ajustados em formarem o partido para a rebelião, e com efeito o dito Tiradentes foi logo de caminho examinando os ânimos das pessoas a quem falava, como foi com os réus José Aires Gomes e o Padre Manuel Rodrigues da Costa; e chegando a Vila Rica a primeira pessoa a quem os sobreditos dois, Tiradentes e Maciel falaram foi ao réu Francisco de Paula Freire de Andrada, que então era Tenente-Coronel comandante da tropa paga da Capitania de Minas, cunhado do dito Maciel; e suposto que o dito réu Francisco de Paula hesitasse no principio em conformar-se com as idéias daqueles dois pérfidos réus, (...) [foi] contudo persuadido pelo mesmo Tiradentes com a falsa asserção de que nesta cidade do Rio de Janeiro havia um grande partido de homens de negócio prontos para ajudarem a sublevação, tanto que ela se efetuasse na Capitania de Minas, e pelo réu Maciel, seu cunhado, com a fantástica promessa de que logo que se executasse a sua infame resolução teriam socorro de potências estrangeiras.
(...)
Mostra-se que sendo pelo princípio do ano de mil setecentos e oitenta e nove, se ajuntaram os réus chefes da conjuração em casa do réu Francisco de Paula, lugar destinado para os torpes e execrandos conventículos, e aí, depois de assentarem uniformemente em que se fizesse a sublevação e motim na ocasião em que se lançasse a derrama, pela qual supunham que estaria o povo desgostoso, o que se prova por todas as confissões dos réus nas perguntas constantes dos apensos, passou cada um a proferir o seu voto sobre o modo de estabelecerem a sua ideada república, e resolveram que, lançada a derrama, se gritaria uma noite pelas ruas da dita Vila Rica – Viva a Liberdade – a cujas vozes sem dúvida acudiria o povo, que se achava consternado, e o réu Francisco de Paula formaria a tropa, fingindo querer rebater o motim, manejando-a com arte de dissimulação enquanto da Cachoeira, onde assistia o governador geral, não chegava a sua cabeça, que devia ser-lhe cortada, ou segundo o voto de outros, bastaria que o mesmo general fosse preso e conduzido fora dos limites da Capitania, dizendo-se-lhe que se fosse embora, e que dissesse em Portugal que já nas Minas se não necessitava de Governadores (...).
(...)
Mostra-se que com o mesmo pérfido ânimo e escandalosa ousadia partiu o réu de Vila Rica para esta cidade, em março de mil setecentos e oitenta e nove, com intento de pública e particularmente, com as sua costumadas práticas, convidar gente para o seu partido, dizendo a Joaquim Silvério dos Reis, que reputava ser do número dos conjurados, encontrando-o no caminho, perante várias pessoas - cá vou trabalhar para todos - o que juram as testemunhas (...).
(...)
(...) declarando o dito réu Tiradentes que na dita conversação dissera o modo com que a América se podia fazer república (...) junto tudo com o conceito que formava de que todos os nacionais deste Estado desejavam a liberdade, como a América Inglesa, e que tendo ocasião fariam o mesmo (...).
(...)
Mostra-se que os infames réus cabeças da conjuração teriam suscitado o levante na ocasião da derrama, ao menos quanto estava de sua parte, se Joaquim Silvério dos Reis se esquecesse das obrigações de católico e de vassalo, e de desempenhar a fidelidade e honra dos portugueses, deixando de delatar a prática e convite que lhe fizeram Luís Vaz de Toledo e seu irmão Carlos Correia de Toledo, vigário que foi na Vila de São José, para entrar na conjuração declarando-lhe tudo quanto estava ajustado entre os conjurados, persuadidos de que o dito Joaquim Silvério quereria ajudar a rebelião, para se ver livre da grande dívida que tinha com a Fazenda Real, sendo este um dos artigos da negra conjuração, perdoarem-se às dividas a todos os devedores da Real Fazenda; mas prevalecendo no dito Joaquim Silvério a fidelidade e lealdade que devia ter como vassalo da dita Senhora, delatou tudo ao governador da Capitania de Minas em quinze de março de mil setecentos e oitenta e nove (...).
(...)
Estando plenamente provado o crime de lesa-majestade da primeira cabeça, pelas uniformes confissões dos réus, no qual os chefes da conjuração incorreram, ajustando entre si nos conventículos a que premeditadamente concorriam, de se subtraírem da sujeição em que nasceram, e que como vassalos deviam ter a dita Senhora, para constituírem em república independente, por meio de uma formal rebelião, pela qual assentaram de assassinar ou depor o general e ministros, a quem a mesma Senhora tinha dado a jurisdição e poder de reger e governar os povos da Capitania; não pode um delito tão horrendo, revestido de circunstâncias tão atrozes, e tão concludentemente provado, admitir defesa que mereça a menor atenção (...).
(...)
Portanto condenam ao réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha o Tiradentes, alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas, a que, com baraço e pregão, seja conduzido pelas ruas públicas ao lugar da forca, e nela morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica, onde no lugar mais público será pregada em um poste alto, até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregado em postes, pelo caminho de Minas, no sitio da Varginha e das Cebolas, onde o réu teve as suas infames práticas, e os mais nos sítios de maiores povoações, até que o tempo também os consuma, declaram o réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens aplicam para o Fisco e Câmara Real, e a casa em que vivia em Vila Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique, e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados, e no mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infâmia deste abominável réu (...).

Rio de Janeiro, 18 de abril de 1792.

Tiradentes Esquartejado – Pedro Américo (1893).

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Ideiascom



Nascida do desejo de 2 professores (este que vos fala e o professor Raul Motta, de artes) e 10 alunos (Kevin, Bruno, Lara, Rosina, Nicolly, Gabriel, Jonathan, Victoria, Marcele e Pedro Lucas) da Escola Municipal Affonso Penna, ávidos pela realização de atividades as mais diversas fora do espaço da sala de aula, a oficina "ideiascom" fez seu primeiro encontro no dia 03/09/2010, e voltou a se reunir hoje, 10/09/2010.

A oficina é livre. Participa quem quer. E ela se torna interessante por causa disso. A nós, professores, ela permite um contato mais próximo com os alunos, dos quais passamos a conhecer os interesses e produção cultural e artística. Aos alunos, ela oferece um movimento oposto ao que se vê geralmente nas escolas. Ao invés de "servirem" à escola realizando trabalhos que não são do seu interesse, sendo massacrados por provas e por vezes recebendo tratamento pouco digno por parte dos professores, os alunos passam a se servir da instituição escolar, da qual utilizam o espaço físico, os professores (sim, sou e desejo seu usado pelos alunos), os aparelhos tecnológicos (computadores, tvs, copiadoras, etc) e o nome da instituição.

À recém-nascida oficina "ideiascom", meus votos de vida longa! Espero que este espaço - onde alunos e professores têm funções diferentes, mas não hierarquizadas - seja de grande proveito para que os alunos exerçam toda a sua criatividade, descubram muitas coisas novas, aprofundem-se em outras, e, sobretudo, divirtam-se com todas.

A mim, enquanto professor, espero me divertir, ensinar e aprender com os colegas da oficina. Se nossos encontros forem tão proveitosos como estes dois primeiros, minha satisfação estará garantida.

OBS: Bem vindo, Yuri!

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Quem escreve a história?

"(...)
Antes que os nativos pudessem se juntar, queimei seis povoados e prendi e levei para o acampamento quatrocentas pessoas, entre homens e mulheres, sem que me fizessem qualquer dano.
(...)
Antes do amanhecer do dia seguinte tornei a sair com cavalos, peões e índios e queimei dez povoados, onde havia mais de três mil casas. Como trazíamos a bandeira da cruz e lutávamos por nossa fé e por serviços de vossa sacra majestade, em sua real ventura nos deu Deus tanta vitória, posto que matamos muita gente sem que nenhum dos nossos sofresse dano." (Pag. 33)

CORTEZ, Hernan. A conquista do México. Porto Alegre, LP&M Editores, 1986.

Neste trecho de uma de suas cartas ao Rei de Espanha Carlos I, o conquistador Hernán Cortez fala das crueldades cometidas pelos espanhóis nas guerras travadas contra os astecas pela conquista do México. O saldo deste choque de civilizações foi, como sabemos, a morte de milhares de astecas, a escravização de outros e a colonização espanhola.

Ainda que saibamos que o México moderno tem sua gênese em uma série de complexas interações culturais entre espanhóis, astecas e membros de outros grupos ameríndios, é inegável que aqueles que impuseram seus costumes, crenças e leis foram os espanhóis, e que os ameríndios foram subjugados ao seu domínio e ao de seus descendentes.

A conquista do México foi um episódio no qual os vencedores foram os espanhóis e os vencidos foram os astecas. Na hora de contarmos esta história, muitas vezes reproduzimos esta situação, narrando e interpretando os fatos do ponto de vista dos conquistadores e esquecendo os vencidos.

Pensem nisso e me ajudem a responder a seguinte questão: como formular uma aula sobre a conquista do México sem esquecer dos vencidos (astecas)? Como conciliar, numa aula, o ponto de vista dos vencedores e dos vencidos?