segunda-feira, 18 de outubro de 2010

É o mesmo Tiradentes???



Acórdão judicial que condenou Tiradentes e outros inconfidentes mineiros

Mostra-se que na Capitania de Minas alguns vassalos da dita Senhora, animados do espírito de pérfida ambição, formaram um infame plano para se subtraírem da sujeição e obediência devida à mesma Senhora, pretendendo desmembrar e separar do Estado aquela Capitania, para formarem uma república independente, por meio de uma formal rebelião, da qual se erigiram em chefes e cabeças, seduzindo a uns para ajudarem e concorrerem para aquela pérfida ação, e comunicando a outros os seus atrozes e abomináveis intentos, em que todos guardavam maliciosamente o mais inviolável silêncio, para que a conjuração pudesse produzir o efeito que todos mostravam desejar, pelo segredo e cautela com que se reservavam de que chegasse à notícia do governador e ministros; porque este era o meio de levarem avante aquele horrendo atentado, urdido pela infidelidade e perfídia; pelo que não só os chefes cabeças da conjuração e os ajudadores da rebelião se constituíram réus do crime de lesa-majestade da primeira cabeça, mas também os sabedores e consentidores dela pelo seu silêncio; sendo tal a maldade e prevaricação destes réus, que sem remorsos faltaram à mais recomendável obrigação de vassalos e de católicos, e sem horror contraíram a infâmia de traidores, sempre inerente e anexa a tão enorme e detestável delito.
Mostra-se que entre os chefes e cabeças da conjuração o primeiro que suscitou as idéias de república foi o réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha o Tiradentes, alferes que foi da Cavalaria paga da Capitania de Minas, o qual há muito tempo que tinha concebido o abominável intento de conduzir os povos daquela Capitania a uma rebelião pela qual se subtraíssem da justa obediência devida à dita Senhora formando para este fim publicamente discursos sediciosos (...).
(...)
Mostra-se que tendo o dito réu Tiradentes publicado aquelas horríveis e notórias falsidades, como alicerce da infame máquina que pretendia estabelecer, comunicou em setembro de mil setecentos e oitenta e oito as suas perversas idéias ao réu José Alvares Maciel, visitando-o nesta cidade a tempo que o dito Maciel chegava de viajar por alguns reinos estrangeiros, para se recolher a Vila Rica donde era natural, (...) ; e tendo o dito réu Tiradentes encontrado no mesmo Maciel não só aprovação, mas também novos argumentos, que o confirmaram nos seus execrandos projetos, (...) saíram os referidos dois réus desta cidade para Vila Rica, Capital da Capitania de Minas, ajustados em formarem o partido para a rebelião, e com efeito o dito Tiradentes foi logo de caminho examinando os ânimos das pessoas a quem falava, como foi com os réus José Aires Gomes e o Padre Manuel Rodrigues da Costa; e chegando a Vila Rica a primeira pessoa a quem os sobreditos dois, Tiradentes e Maciel falaram foi ao réu Francisco de Paula Freire de Andrada, que então era Tenente-Coronel comandante da tropa paga da Capitania de Minas, cunhado do dito Maciel; e suposto que o dito réu Francisco de Paula hesitasse no principio em conformar-se com as idéias daqueles dois pérfidos réus, (...) [foi] contudo persuadido pelo mesmo Tiradentes com a falsa asserção de que nesta cidade do Rio de Janeiro havia um grande partido de homens de negócio prontos para ajudarem a sublevação, tanto que ela se efetuasse na Capitania de Minas, e pelo réu Maciel, seu cunhado, com a fantástica promessa de que logo que se executasse a sua infame resolução teriam socorro de potências estrangeiras.
(...)
Mostra-se que sendo pelo princípio do ano de mil setecentos e oitenta e nove, se ajuntaram os réus chefes da conjuração em casa do réu Francisco de Paula, lugar destinado para os torpes e execrandos conventículos, e aí, depois de assentarem uniformemente em que se fizesse a sublevação e motim na ocasião em que se lançasse a derrama, pela qual supunham que estaria o povo desgostoso, o que se prova por todas as confissões dos réus nas perguntas constantes dos apensos, passou cada um a proferir o seu voto sobre o modo de estabelecerem a sua ideada república, e resolveram que, lançada a derrama, se gritaria uma noite pelas ruas da dita Vila Rica – Viva a Liberdade – a cujas vozes sem dúvida acudiria o povo, que se achava consternado, e o réu Francisco de Paula formaria a tropa, fingindo querer rebater o motim, manejando-a com arte de dissimulação enquanto da Cachoeira, onde assistia o governador geral, não chegava a sua cabeça, que devia ser-lhe cortada, ou segundo o voto de outros, bastaria que o mesmo general fosse preso e conduzido fora dos limites da Capitania, dizendo-se-lhe que se fosse embora, e que dissesse em Portugal que já nas Minas se não necessitava de Governadores (...).
(...)
Mostra-se que com o mesmo pérfido ânimo e escandalosa ousadia partiu o réu de Vila Rica para esta cidade, em março de mil setecentos e oitenta e nove, com intento de pública e particularmente, com as sua costumadas práticas, convidar gente para o seu partido, dizendo a Joaquim Silvério dos Reis, que reputava ser do número dos conjurados, encontrando-o no caminho, perante várias pessoas - cá vou trabalhar para todos - o que juram as testemunhas (...).
(...)
(...) declarando o dito réu Tiradentes que na dita conversação dissera o modo com que a América se podia fazer república (...) junto tudo com o conceito que formava de que todos os nacionais deste Estado desejavam a liberdade, como a América Inglesa, e que tendo ocasião fariam o mesmo (...).
(...)
Mostra-se que os infames réus cabeças da conjuração teriam suscitado o levante na ocasião da derrama, ao menos quanto estava de sua parte, se Joaquim Silvério dos Reis se esquecesse das obrigações de católico e de vassalo, e de desempenhar a fidelidade e honra dos portugueses, deixando de delatar a prática e convite que lhe fizeram Luís Vaz de Toledo e seu irmão Carlos Correia de Toledo, vigário que foi na Vila de São José, para entrar na conjuração declarando-lhe tudo quanto estava ajustado entre os conjurados, persuadidos de que o dito Joaquim Silvério quereria ajudar a rebelião, para se ver livre da grande dívida que tinha com a Fazenda Real, sendo este um dos artigos da negra conjuração, perdoarem-se às dividas a todos os devedores da Real Fazenda; mas prevalecendo no dito Joaquim Silvério a fidelidade e lealdade que devia ter como vassalo da dita Senhora, delatou tudo ao governador da Capitania de Minas em quinze de março de mil setecentos e oitenta e nove (...).
(...)
Estando plenamente provado o crime de lesa-majestade da primeira cabeça, pelas uniformes confissões dos réus, no qual os chefes da conjuração incorreram, ajustando entre si nos conventículos a que premeditadamente concorriam, de se subtraírem da sujeição em que nasceram, e que como vassalos deviam ter a dita Senhora, para constituírem em república independente, por meio de uma formal rebelião, pela qual assentaram de assassinar ou depor o general e ministros, a quem a mesma Senhora tinha dado a jurisdição e poder de reger e governar os povos da Capitania; não pode um delito tão horrendo, revestido de circunstâncias tão atrozes, e tão concludentemente provado, admitir defesa que mereça a menor atenção (...).
(...)
Portanto condenam ao réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha o Tiradentes, alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas, a que, com baraço e pregão, seja conduzido pelas ruas públicas ao lugar da forca, e nela morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica, onde no lugar mais público será pregada em um poste alto, até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregado em postes, pelo caminho de Minas, no sitio da Varginha e das Cebolas, onde o réu teve as suas infames práticas, e os mais nos sítios de maiores povoações, até que o tempo também os consuma, declaram o réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens aplicam para o Fisco e Câmara Real, e a casa em que vivia em Vila Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique, e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados, e no mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infâmia deste abominável réu (...).

Rio de Janeiro, 18 de abril de 1792.

Tiradentes Esquartejado – Pedro Américo (1893).

Um comentário:

  1. aaah ):
    queria ver se as respostas do trabalho estavam aqui... O trabalho que você passou é muito difícil ):

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